sexta-feira, 17 de julho de 2009

UM OLHAR CRÍTICO DA BRANCA DE NEVE NUMA PERSPECTIVA DA AUTO ESTIMA

Os contos de fadas sempre influenciaram o comportamento da mulher levando-as as mais belas fantasias do que a esperavam no futuro. Príncipes, vestidos de gala, bailes, fugas e aventuras permeiam a imaginação feminina desde que ela começa a fazer um paralelo entre o real e o imaginário, em sua exata noção do que é permitido e o que é proibido.

Dentro desta perspectiva do real e o imaginário, chegamos perto do nosso padrão de perfeição. É o desejo pelo proibido que desperta as tendências de satisfazer-se através das fantasias, esta é uma necessidade intrínseca que a mulher busca de sentir-se realizada sob a ótica permitida por ela mesma sem sofrer censuras daqueles que inconscientemente se contentam em suprimir seus desejos.

Deste modo as fantasias nos possibilitam uma descoberta pessoal levando-nos ao enfrentamento dos nossos tabus e superação dos nossos preconceitos.

Muitas mulheres ainda no século XXI nos remetem a comportamentos tipicamente submissos, onde a predominância do homem sobre a mulher desperta a atenção de estudiosos e mobiliza a classe feminina em busca de conquistas e, sobretudo, de visibilidade social.

Trataremos aqui do comportamento da nem tão fantasiosa assim Branca de Neve que em uma análise mais próxima da nossa realidade, é uma mulher vitima das circunstâncias, órfã de mãe (acometida por uma doença fatal) e vitima cruel de uma madrasta acometida pelo narcisismo e consumida pela sua arrogância, mostrando até que ponto alguém pode ir para sentir-se aceita por si mesma.

Isto a levou a apelar por meios medíocres para a satisfação de seu ego, qualquer coisa valia desde que sua estrutura emocional não ficasse ameaçada. Já que a beleza era o seu meio de exercer tal poder, e Branca de Neve imperava por ser a mais bela do reino, nada melhor do que eliminar o seu calcanhar de Aquiles. Esta moça mostrava-se muito meiga, prestativa, vulnerável e com a auto-estima completamente destruída.

Interessante é que o conto dos irmãos Grimm associa a sua falta de atitude, submissão e seu fracasso à humildade, meiguice e educação, como se para ser humilde, meiga, educada e aceita deveríamos nos submeter às intransigências e poder que os outros supostamente exercem sobre nós, tais como: VIOLAÇÃO DE SEUS DIREITOS, DESRESPEITO A SUA INTEGRIDADE MORAL E AO SEU LIVRE ARBÍTRIO.

Comumente vemos as pessoas atropelando as outras em defesa de seus próprios interesses, com Branca de Neve não foi diferente, afinal, alguém tinha que manter o controle da situação e é claro que este controle não estava nas mãos de uma menina ingênua, meiga, carente e sozinha, então a rainha, sentindo-se despeitada com a beleza da enteada, tratou imediatamente de tirá-la do seu caminho.

Bem, esta parte da estória não é novidade, mais o que me chamou atenção é que diante da coragem do caçador, a bela humilde e meiga ganhou a oportunidade de reverter este papel de vitima, sendo a protagonista de sua própria estória, dando a volta por cima na suas fraquezas, enfrentando o contexto histórico onde foi inserida e criando a sua própria identidade.

Muitas vezes nós temos oportunidades únicas na vida para revermos alguns conceitos ou valores que nos aprisionam, heranças culturais que fizeram da mulher objeto de desejo do homem, escrava dos afazeres do lar sem direito a voz e liberdade de expressão e troféu daqueles que colecionavam conquistas.

A mulher tem a capacidade ímpar de fazer inúmeras coisas ao mesmo tempo e o faz em sua grande maioria com muita competência. Branca, voltada apenas para os afazeres domésticos, não vislumbrou perspectiva melhor de futuro, encontrar uma casinha onde pudesse ser útil varrendo, limpando, cozinhando e lavando, lhe bastava. Casa, comida e cama quentinha lhe confortavam a alma enquanto a rainha continuava a criar mecanismos de auto aceitação.

É bom lembrar que os contos em sua origem foram escritos para o público adulto e que somente no século XIX os irmãos Grimm os adaptaram para o público infantil. deste modo, se hoje muitas mulheres ainda se vêem como princesas sabendo que estão entrando num universo infantil, imagine quantas não foram seduzidas pela trajetória de vida daquelas princesas embebidas de crueldade e erotismo? No livro "O Estádio do espelho como formador da função do eu" de Lacan, ele diz que “É no enfrentamento dialético prazer-realidade que são estabelecidas as diferenças entre eu - mundo, dentro-fora, realidade – fantasia”

A trajetória comportamental de submissão da mulher esta intrinsecamente relacionada com a condenação dada a Eva segundo a Bíblia Sagrada. Como sabemos foi ela quem mordeu a tal maçã, símbolo do pecado e do desejo. Se Eva não resistiu, porque que nós temos que pagar eternamente pela sua audácia, por ela ter sucumbido à sedução do desconhecido? Ela simplesmente fez o que Branca de Neve gostaria de ter feito com a madrasta, de ter enfrentado seus medos e inseguranças colocado-a em seu lugar, mostrando que Branca podia ser linda e meiga, mas era, sobretudo, uma mulher que sabia o que queria e não se deixaria abater por coisas tão pequenas como a mediocridade de sua madrasta, no entanto, faltou-lhe poder interior para mudar tal contexto.

Se vamos ter que pagar pela “imprudência” de Eva, porque não fazer isto de forma justa e consciente? O medo do puritanismo social nos freia na busca da realização dos nossos mais obscenos desejos.

No entanto após a segunda guerra mundial, este cenário ensaia mudança fazendo com que a mulher saia da inércia cultural e enfrente o seu verdadeiro dilema – a conquista de si mesma.

A mulher tem hoje a possibilidade de reescrever sua historia, deixando para trás o mito que por muitos anos a deixou como Branca de Neve e muitas outras princesas submissas aos desgostos que a vida lhe impôs. Deixar de ser coadjuvante para adotar uma postura propositiva, requer audácia, pois precisamos romper com a imagem estigmatizada e estereotipada que se tem de si mesma, fruto de uma cultural paternalista e opressora, onde o que menos importava era a satisfação do ego feminino, a valorização dos sentimentos e a busca pela realização pessoal e profissional da mulher.

Essas inquietações, fortalecidas pelos movimentos feministas e pela valoração da mulher como símbolo da sensualidade e da promoção de objetos de consumo fez com que percebêssemos que podemos deter parte do poder até então retida nas mãos dos homens.

O príncipe e a princesa foram mesmo felizes para sempre? Eu duvido muito, tendo em vista que um relacionamento não se sustenta por muito tempo quando um dos dois é um dependente emocional, incapaz de amar a si próprio e lutar por seus ideais de vida.

Valéria Duarte

Um comentário:

  1. Obrigada pela visita e pelo comentário em meu blog.
    Interessante essa reflexão!
    Abraços

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